terça-feira, 25 de junho de 2013

"Nós temos uma capacidade de ajudar extraordinária"

À Conversa com Simone de Oliveira e Márcia Breia (Parte II)

L: Quem é que acha que são os culpados da crise, da situação em que nos encontramos?
S.O: Não vou dizer que é a senhora Merkel, se não dizem que eu digo uma coisa que é… O que é que quer que eu lhe diga? Houve muita coisa mal feita, mal pensada, portanto, coisas que as pessoas imaginaram que se podia fazer. Acho que gastámos, um bocadinho, a mais do que devíamos gastar, digo nós… nós próprios também, mas o próprio governo. O dinheiro acaba, não é?! As más decisões… penso que houve muitas más decisões, em determinadas alturas, neste país e não só.
Não sou uma mulher versada em política, a Márcia é muito mais do que eu. Não sou e não sei explicar porque é que isto está assim, gostava de perceber porque é que isto está assim, se a Márcia quiser dar uma ajuda …

M.B: O isto português ou o isto geral? Porque a sensação que eu tenho, é que o isto português tem muito a ver com a facilidade económico-financeira, que houve durante os anos 80 até aqui. Tem a ver com a banca, que abriu as portas, desmesuradamente, com lucros absolutamente exorbitantes para os créditos. Claro que do lado de quem pede, também há uma responsabilidade, mas é evidente que se passarmos 50 anos sem nada, ter qualquer coisa que se vislumbre…direito a teres uns bens, automaticamente, se te facilitam tudo, cedes, vais por aí fora…E depois há, efetivamente maus governantes e há uma coisa terrível, que a mim me parece que acontece, isso agora é a minha faceta politica, porque eu sou menos ingénua do que ela (Simone), nesse aspeto… A Alemanha tem uma hegemonia muito grande, na Europa e a Alemanha, o ano passado, acabou de pagar a sua divida de guerra, da 2ª Guerra Mundial… A Alemanha teve de pagar uma grande divida, como perdedora da 2ª Guerra Mundial, portanto, há que cobrar isso. A Alemanha é um país da Europa, com uma hegemonia enorme e com um grande poder sobre os outros países, talvez a França a seguir… o resto é a raia miúda.
O país é pequeno, teve problemas, efetivamente, mais olhos do que barriga. Bom… mas nem tudo foi mau, porque se conquistaram muitas coisas e as pessoas têm muito má memória. As pessoas desde 75 até esta parte viveram, tiveram acesso a coisas que não havia e aí eu estou como ela, eu não fui uma pessoa com necessidades materiais, tive que comer e tudo, estudei no liceu mas… tenho que dizer que, por exemplo, no campo não havia… ninguém comia manteiga e não havia leite, o leite que havia era para vender. Havia então algumas vaquinhas e algumas ovelhas… isto é a sério, não é romântico. Nem tudo foi mau, o progresso atingimos de uma maneira muito boa, agora dos anos 80 para cá, houve facilitismo tanto da parte dos políticos, governantes. O Politico pode não ser governante e ser honesto e ser sério e ter uma ideia… Nós somos políticos todos os dias, ao escolher, somos políticos!
Agora, na conjuntura europeia, eu acho que a Alemanha está aqui a cortar uma boa fatia do bolo, para si própria. Não tenho paciência nenhuma para a vassalagem à Alemanha, o que eu acho que este governo está a fazer.

S.O: Uma vassalagem absoluta, total, não sei se foi obrigado, pelo que está atrás…
Como é que se resolve? Eu sei lá…eu, às vezes, não sei como é que se resolvem as coisas aqui em casa (Risos). Está tudo ligado. Lá para trás como é que é? Já não é problema de comprar a marmelada é o problema de comprar as batatas e há quem não tenham nem dinheiro para as batatas…
Já não é problema da marmelada, toda a gente viveu sem marmelada, sem detergentes, havia sabão azul e branco… Nós, agora, é que se faltar o Tide ou qualquer coisa que valha, deitamos mãos à cabeça, que horror! Eu sou do tempo do sabão amarelo e do sabão azul e branco…
Não havia os Champôs, não havia nada dessas coisas… agora: Vê lá tu que acabou aquele Champô assim… qual é o problema? Lava-se ali na beira, só que vocês não sentem assim…já não pensam, nem são capazes de sentir assim.

M.B: Por um lado, felizmente.
S.O: Pois, ainda bem, ainda bem… ainda bem que há o champô e não sei o quê, mas depois se se fizer comparações, se se fizer comparações, Márcia…

M.B: Só que enquanto eu sou capaz de abdicar de tudo, para viver de outra maneira… Tanto posso viver assim, como viver no fundo. E vivo e adapto-me e tento não ficar na “coitadinha, ai Jesus”… a maior parte das pessoas, que nunca tiveram um background como eu e muitas pessoas da minha geração tivemos, não percebem e andam perdidas e eu sinto as pessoas perdidas mesmo.
S.O: Completamente perdidas. No entanto, você, tem aqui um exemplo do contrário disto tudo… há os concertos de todos os estrangeiros, eu não estou contra os estrangeiros, esgotam completamente…onde a tua neta quer ir, para novembro e já está esgotado.  Aqui começa a minha cabeça… vem aqui essa criança que se chama Justin Bieber, que é… tadinho… não canta, não é bonito, não é alto… Em dois dias… 18 mil pessoas… está tudo parvo a olhar para uma criança que é “anormal” ela não é “anormal”, pronto, tem à volta dela… os concertos esgotam todos. E o do Norte e o do Sul e o do Noroeste e o do Meco está tudo esgotado! E depois… ai que crise, ai que crise! Então? Porque os miúdos que vão, quem é que compra os bilhetes? Os pais, os tios, os avós…mas esgotam.
Também temos outra coisa, vem o banco alimentar, nós, em dois dias, damos duas toneladas de alimentos. Dizia a minha filha, com muita graça, que vive no Luxemburgo, no Luxemburgo nem num ano, eles davam uma tonelada de alimentos. Nós temos essa capacidade, também de dar, agora espero que isso seja encaminhado para quem realmente precisa. Pois… engolimos um bocadinho em seco.

M.B: Então aí é que eu não me meto, que nada sei…
S.O: Eu também não sei e, naturalmente, também não me apetece saber. Acredito que sim, acredito que sim.

M.B: As pessoa que eu conheço, que lidam com essas coisas, de perto, são pessoas em quem que confio.
S.O: Claro, isso… nós temos uma capacidade de ajudar extraordinária, isso é um facto, isso temos. Mas… houve um tempo em que isso não era assim… ai tens um frigorífico? Eu quero ter dois. Somos muito assim, o vizinho tem aquele carro… vá ao parque automóvel da Cidade Universitária… quem é que comprou aqueles carros todos, se está tudo a estudar? Eu não fui, não estou lá, alguém comprou…são os pais, os tios. Portanto, houve essa fase toda, agora está tudo muito aflito ai, ai, ai, ai…
M.B: Os anos 80, abriram umas portas absolutamente falsas.
S.O: Fez-se empréstimos às pessoas sem lhe perguntar: Então e você pode pagar? Porque também toda a gente pensou que ia continuar assim.

Agora como é que se resolve? Não faço a menor ideia… 

Aline Araújo; Pedro Emídio; Rute Fidalgo

* Devido à sua dimensão, a entrevista será dividida em vários posts. 

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